PROFESSOR DE DANÇAS

PROFESSOR DE DANÇAS
PROFE MARCOS MEIRA

terça-feira, 1 de maio de 2012

COMO NASCEU O TRADICIONALISMO GAÚCHO





Há 60 anos, quase à meia-noite de 7 de setembro de 1947, uma
façanha surpreendeu o Rio Grande do Sul.

Um grupo de oito estudantes, liderados por João Carlos D
Ávila Paixão Côrtes, teve a idéia de capturar uma fagulha da Pira da
Pátria, em Porto Alegre, utilizando um cabo de vassoura com trapos
enrolados na ponta. O improvisado gesto tornou-se épico: lançou as
bases do Movimento Tradicionalista Gaúcho, que hoje se espalha pelo
Brasil e já chega aos Estados Unidos, à Europa e à Ásia.

Cavaleiros que atualmente percorrem o Estado transportando
archotes com a Chama Crioula, enfrentando frio e chuva, são gratos ao
pioneirismo de Paixão Côrtes e sua turma. Alunos do Colégio Estadual
Júlio de Castilhos, na capital, eles sofreram vaias e zombarias naquele
1947. Era ridículo andar de bombachas, também não convinha
tomar chimarrão nas praças.

 


 

Os oito desbravadores da Chama Crioula estavam no ardor dos
seus 20 anos, eram saudosos do umbigo deixado no campo e, sobretudo.
Tiveram a sagacidade de notar que os hábitos e cultura do Rio Grande
do Sul poderiam ser exterminados. Naquele pós-II Guerra Mundial, a
hegemonia norte-americana se infiltrava por meio de músicas, filmes,
estilos e o modo de vida caubói. Para completar, a herança da ditadura
Vargas (1937-19450) inibia a valorização regionalista em nome da
unidade brasileira.




Paixão Côrtes e os sete companheiros perceberam a urgência
de agir, e antes que fosse tarde. Organizaram um Departamento de
Tradições Gaúchas (DTG) dentro do Colégio Julinho, estimulando
concursos de danças, poesias, culinária, tertúlias e palestras.
Embrião dos atuais Centros de Tradições Gaúchas (CTGs), o DTG criou
objetivos que até hoje vigoram. É uma espécie de Constituição Crioula.

Os oito bombachudos fizeram outras proezas, abismando os
cerca de 350 mil moradores daquela Porto Alegre que já ganhava
contornos de metrópole com edifícios, avenidas e o ronco dos
automóveis. Ao salvarem o que parecia se perder nos galpões,
transformaram o ano de 1947 em mais um documento de identidade dos
rio-grandenses. A Chama Crioula acendeu, há seis décadas, o fervor em
ser gaúcho.




A Chama Crioula não foi eternizada num repente. Antes de
criarem o lume que apontaria os novos rumos para as tradições gaúchas,
Paixão Côrtes e os sete amigos do Colégio Júlio de Castilhos sacudiram
Porto Alegre.

As surpresas começaram no final de agosto, quando montaram
um simbólico galpão dentro do Julinho, com fogo de chão, roda de mate
e declamação de poesias, fundando o Departamento de Tradições Gaúchas
(DTG). Foi o marco para os CTGs.





Em 5 de setembro, os oito jovens emocionaram a Capital ao
escoltar os restos mortais do general farroupilha David Canabarro.
Pilchados, com cavalos cedidos pelo Regimento Osório, acompanharam o
esquife de Canabarro, transportando de Santana do Livramento para ser
enterrado no Panteão Rio-Grandense, em Porto Alegre. As exéquias
faziam parte da Semana da Pátria. Acostumados a gracejos e deboches,
comoveram-se com a receptividade.

- As pessoas abanavam lenços, algumas choravam de emoção. O
Rio Grande se reagauchava lembra Paixão Côrtes.

Um acidente comprometeu a escolta. Na Rua da Conceição, o
cavalo de Cilço Araújo Campos, um dos porta-bandeiras do piquete,
escorregou e se pranchou (caiu de lado). Fernando Vieira, que vinha
atrás, esporeou a sua montaria e alcançou a bandeira do Brasil no ar,
evitando que caísse. A sua perícia foi aplaudida pelo povo.
  

 O cortejo de honra rendeu valiosas adesões. Maravilhado com
aqueles gaudérios que evocavam Piratini, onde nasceu, Luiz Carlos Barbosa Lessa se integrou ao grupo. O futuro escritor, folclorista, músico e historiador era outro desgarrado que se afligia com as trevas que engolfavam a cultura gaúcha.
O governo não cumpriu a promessa de construir o panteão
(Canabarro jaz numa parede do Cemitério da Santa Casa), mas os oito colegas seguiram a cavalgada, reforçados por novos idealistas. Em 7 desetembro, quando Paixão Côrtes apanhou uma centelha do fogo da Pira da Pátria, já havia voluntários suficientes para a Ronda que se estendeu até o dia 20, a data da RevoluçãO Farroupilha. Ivo Sanguinetti, Rubem Xavier, Barbosa Lessa, e outros indormidos ajudaram a manter aceso o candeeiro crioulo.




A centelha que ilumina o gauchismo




Os oito Julianos

Cyro Dutra Ferreira nasceu em Porto Alegre, em 1927 (já falecido).
Fazendeiro em General Câmara e patrão do CTG 35.

Antônio João Sá de Siqueira nasceu em Bagé, em 1928. Veterinário e
professor universitário.

Orlando Jorge Degrazia nasceu em Itaqui, em 1929 (já falecido).
Pecuarista em Cruz Alta e procurador-adjunto do Tribunal de Contas.

Fernando Machado Vieira nasceu em Porto Alegre em 1929 (já
falecido). Pecuarista em Cruz Alta, onde foi vice-prefeito.

João Carlos D´Ávila Paixão Côrtes nasceu em Livramento, em 1927.
Engenheiro-agrônomo, artista, folclorista e dançarino, autor de livros
e pesquisas históricas.

Ciro Dias da Costa nasceu em Pelotas, em 1928 (já falecido).
Engenheiro-agrônomo e vice-presidente da Fecotrigo.

Cilço Araújo Campos nasceu em Alegrete, em 1924 (já falecido).
Cirurgião-dentista e major da Brigada Militar.
João Machado Vieira nasceu em Porto Alegre, em 1927 (já falecido).
Advogado e pecuarista em Cruz Alta e no Mato Grosso.


No relho para impor respeito

Enquanto cavalgam pela Capital para despertar o civismo
gauchesco nos moradores, os oito estudantes do Julinho enfrentam
preconceitos. Ao fim da escolta dos restos mortais de David Canabarro,
próximo do cemitério da Santa Casa, Paixão Côrtes é insultado por um
homem que circula no bairro Azenha numa charrete aberta:

- Ô, palhaço, o Carnaval já terminou!

Ofendido, Paixão monta a cavalo e golpeia o zombador com um
mango (pequeno relho), de papada de touro por ter um látego de couro
cru de três dedos de largura. O outro contra-ataca com um relhador, o
longo chicote dos cocheiros. Os brigões são contidos pela polícia.





(Suplemento de Zero Hora, de 2 de setembro de 2007)*


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